Com a pandemia do novo coronavírus se agravando, há duas perguntas essenciais: quando o vírus finalmente vai embora e o que vai acontecer com a economia do Brasil?
Para a primeira pergunta, não há resposta. Alguns especialistas acreditam que o vírus vai continuar circulando até haver uma vacina eficaz, outros são mais otimistas e creem que o número de casos atingirá o platô no terceiro trimestre do ano ou um pouco antes.
Sobre o rumo econômico do Brasil, a fintech Bom pra Crédito conversou com alguns especialistas e já tem algumas previsões para os próximos meses e anos. O que se pode afirmar é que teremos uma economia modificada pelas relações impostas no período da Covid-19.
Competitividade, por Dernizo Pagnoncelli, economista e consultor de empresas
O cenário que está ficando claro pelo mundo é a volta do protecionismo. Isso pode trazer para um país como o Brasil, que ainda não fez toda integração de suas cadeias produtivas na globalização, muitas oportunidades internas, desde que existam políticas públicas para tal.
Talvez recuperar um pouco do modelo de substituição de importações que foi utilizado na década de 70 e 80, que permitiu ao país ter um grande crescimento. Nesse caso, a pergunta que as empresas têm que responder é “Que produtos podemos fazer no Brasil que vão substituir hoje os que são importados?”.
O exemplo dos equipamentos médicos durante a pandemia deu ao mundo a noção de que a concentração de produção em um só país é de alto risco. A China criou um plano inclinado nos últimos 20, 30 anos, de que ela poderia produzir tudo sem preocupação com o custo. Enfrentou a competição baixando preços, subsidiando sua produção com mão de obra quase escrava.
Com isso, ganhou alguns mercados e vem impondo ao mundo as novas condições. Agora os países estão sentindo o efeito. O governo Trump escancarou essa estratégia e foi eleito por defender os empregos no país e que os produtos sejam feitos internamente. Não é mais o produto competitivo que vai prevalecer no novo cenário, é o produto made in your country. Todos os países vão repensar suas estratégias de competitividade mundial.
Não basta ser competitivo em preço; vai ser preciso reduzir a dependência de produtos estratégicos.
Empréstimos, por Luciano Wajchenberg, consultor de planejamento financeiro pessoal da LW Consultoria
A pandemia traz como lição a consciência de que risco de crédito é algo existente e que deve ser levado em ampla consideração antes de se emprestar algum montante a alguém.
Estamos vendo empresas sólidas, com elevado faturamento e altamente lucrativas tendo seus ratings de crédito rebaixados, visto que não há qualquer definição sobre como e quando a economia normal será retomada.
Esta incerteza tem impacto direto na avaliação e capacidade de crédito das empresas e pessoas.
O consumidor vai demorar um longo tempo para retomar a confiança e também ter alguma estabilidade em seus rendimentos, portanto eles ficarão mais receosos ao tomar crédito. Acredito que essas lições devem perdurar por algum tempo, mas não sabemos se até a próxima crise.
As empresas também estão temerosos de tomar empréstimos em um momento de total incerteza de falta de caixa mínimo. Além disso, estamos assistindo a uma enorme dificuldade operacional para que os micro e pequenos negócios consigam de fato obter crédito, apesar da liberação de elevadas cifras de empréstimos por parte do governo, bancos privados e públicos.
Trata-se desde um problema de timing entre a concessão e a real necessidade dos negócios, e também a exigência demasiada de documentos e comprovação de que a empresa está 100% de condições de crédito, o que, por si só, e muito complicado no Brasil.
Investimento, por Alessandro Azzoni, economista
É uma grande expectativa que os hábitos de investimentos dos brasileiros mudem com esse freio na economia, mudando o perfil de consumerista para o de investidor.
Antes da pandemia vivíamos tentando planificar nossas despesas, com o objetivo de evitar o endividamento e, por sua vez, ter sobras para investimento. Agora, estamos repensando, o que nos ajuda a pagar despesas básicas e dívidas remanescentes para superar a crise.
Aqueles que saírem empregados e com suas rendas salvas terão um mercado promissor de investimentos. E entre aqueles que perderam emprego, será o momento de poupar e investir seus recursos, principalmente o saldo do FGTS.
A Selic deve bater os 2 a 2,5% a.a. até o final do ano, ou seja, a poupança e os fundos de renda fixa não serão as grandes opções de investimento. O investidor deverá procurar alternativas arrojadas no mercado financeiro com o objetivo de preservar e fazer seu dinheiro crescer.
Finanças pessoais, por Francinaldo Gomes, educador financeiro
Não é possível estimar o tempo que as classes C/D levarão para se recuperar. Entretanto, conforme dados referentes a crises econômicas anteriores, o período médio de recuperação é de 12 a 36 meses, embora a crise atual tenha características peculiares pois afeta simultaneamente a produção e o consumo, de tal forma que o tempo de recuperação pode ser ainda maior.
O cenário das classes A/B é diferente. Por possuírem ativos que trazem renda passiva (como investimentos, empresas, reservas etc), além de comumente possuírem várias fontes de renda, a classe momentaneamente está confortável.
Algumas pessoas estão até mesmo adquirindo ainda mais ativos, aproveitando a atual queda. Com isso, eles tenderão a se recuperar mais rápido do que as classes C/D.
Entretanto, com o prolongamento da crise, é possível que até mesmo as pessoas das classes A/B sejam impactadas de alguma forma, principalmente por conta da falta de mão de obra e também pela falta de consumidores.
Aqueles que estão sentindo o impacto podem iniciar medidas para reduzir gastos: pedir descontos e carência para o pagamento de contas e tributos, negociar dívidas com as instituições financeiras, fazer compras no atacado, reduzir gastos com instituições bancárias – dando preferência para bancos digitais – além de negociar com funcionários e colaboradores.
Ao mesmo tempo, entre as medidas para aumentar receita, as pessoas devem buscar se desfazer de bens que estejam em excesso e sem utilização, desenvolver novas habilidades e criar novas fontes de renda (como a Internet, por exemplo) e utilizar os benefícios concedidos pelo governo.
MPME, por Luciana Ikedo, assessora de investimentos e planejadora financeira
Para as micro, pequenas e médias empresas brasileiras, essa pandemia é um grande desafio, mas também pode representar uma grande oportunidade de ter mais controle na parte financeira, custos e demais receitas.
As empresas também já estão revendo seus processos e inovando, seja em produtos ou serviços, da forma mais otimizada possível.
Buscar formas alternativas de manter-se próximo dos clientes tem surtido bastante efeito e é algo que fluirá bastante no pós-crise. Estão em alta a implantação do atendimento virtual, criação ou ampliação de serviço de delivery, sistema de drive-thru e até mesmo a geração de conteúdo relevante nas mais diversas plataformas e redes sociais que seu público consome. Conhecer as dores do seu consumidor nunca foi tão essencial.
Para as finanças, algumas das muitas estratégias que as MPMEs podem adotar, são: fazer uma projeção do fluxo de caixa para os próximos meses, considerando os custos fixos que não podem ser cortados; aproveitar para tentar negociar com fornecedores a possibilidade de redução nos valores acordados antes da crise, além da renegociação dos aluguéis de imóveis comerciais.
Já para aqueles que possuem dívidas bancárias, que tal solicitar a prorrogação, além de ficar atento às medidas de prorrogação de vencimento de tributos? Refaça orçamentos e, se a conta não fechar, fique atento às linhas de crédito que vêm sendo oferecidas.
Além disso, planejar, estudar e treinar sua equipe. O mais importante é se manter ativo e ser lembrado pelo seu cliente.
Comportamento, por Luciana Fiaux, especialista em finanças pessoais do canal Domine suas Finanças
O consumidor passa por momento de estar mais atento a marcas solidárias e sustentáveis. As empresas que se posicionaram dessa forma vão ter mais atenção do cliente, que estará mais exigente no quesito de empresas que cumprem um papel que não é só o de vendas, mas também de apoio à sociedade
Além disso, o consumo vai se tornar mais ligado à nossa independência e terá um foco maior em saúde e bem-estar. Atualmente, o consumidor percebeu a sua interdependência de tudo e entendeu que, quando um determinado segmento da cadeia produtiva para, ele sente o impacto. Então ele procura formas de ser um pouco mais independente e, ao mesmo tempo, cuidar da saúde e se sentir bem apesar de tudo.
Quando um novo comportamento se torna constante e é repetido por mais de 60 dias, ele acaba sendo incorporado pelo consumidor. Já estamos há mais de dois meses no meio dessa pandemia, então podemos afirmar que essa já é a realidade. E quais tipos de produtos são mais consumidos agora? Itens de beleza são um bom exemplo, uma vez que as pessoas se acostumaram a não ir ao salão e fazer alguns procedimentos em casa.
Um consumo que é importante a qualquer momento, mas que funcionou quase como uma distração nos últimos tempos é o consumo de informação. Temos muita gente fazendo cursos online e essa é uma grande mudança na forma como consumimos informação, porque iremos continuar a consumir online.
Por último, há a expectativa de um consumo minimalista, “menos é mais”. E isso não acontecerá apenas devido a falta de dinheiro – porque passaremos por uma crise econômica – mas principalmente pela valorização da experiência e desvalorização do ter. O consumir por consumir vai ficar fora de moda.
Macroeconomia, por Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da Nova Futura Investimentos
No último Relatório Focus, o Banco Central (BC) anunciou corte da Selic, que passou de 3,75% para 3%, a mínima histórica. O Copom fez o que se espera que ele faça em um regime de metas de inflação. Nesse regime, o BC segue regras explícitas para definir a taxa básica. Nessas regras pesam a inflação e o nível de atividade.
A inflação tem uma meta de 4% em 2020, com uma tolerância de 1,5%. Espera-se que o IPCA fique abaixo de 2% neste ano, bem abaixo do piso. Em relação à atividade, devemos observar uma queda de mais de 5%, a maior já observada, com elevação considerável do desemprego.
Esses dois objetivos sinalizam que a resposta do BC não pode ser tímida diante dessa grande queda da atividade econômica. Acrescente-se ainda, que o Brasil não tem espaço fiscal para adotar políticas de gastos para estimular a demanda. Essa ausência de espaço reforça a necessidade de se adotar uma postura mais agressiva na política monetária.
Sendo assim…
A qual conclusão chegamos após ler todas essas opiniões? É fato que o futuro econômico tanto do Brasil, quanto do mundo, é incerto. Mas, uma coisa é possível afirmar: os rumos da economia vão mudar, e muito. E isso no que diz respeito a absolutamente tudo.
Desde o consumo, até como lidar com dinheiro, passando pela percepção do mercado, entre outros âmbitos.
É momento de aprender e entender mais sobre esse marco na história da economia mundial.