Desde meados de julho está para análise presidencial (e que deve ser aprovado) o projeto que altera o Marco Civil da Internet (projeto de lei de Proteção de Dados Pessoal – 58/2018). A proposta brasileira acontece pouco depois da Europa aprovar, em 25 de maio, sua nova legislação, a GDPR – General Data Protection Regulation.
Em ambas, a discussão gira em torno do tratamento e proteção de dados pessoais em ambiente virtual – um assunto extremamente importante atualmente, uma vez que são mais de 4 bilhões de pessoas conectadas globalmente (no Brasil, mais da metade da população brasileira já está com acesso à internet, de acordo com dado recente do IBGE).
Muito já se discutia sobre a questão antes das leis, mas até então não havia regulações legais rígidas. A espionagem e vazamento de dados aceleraram as preocupações e, claro, as aprovações políticas. Antes da GDPR, o mais próximo de uma regra ampla era a chamada CAN-SPAM ACT (Controlling the Assault of Non-Solicited Pornography And Marketing), meio que um guia de compliance feito pelos Estados Unidos (o Marco brasileiro contém algo sobre proteção de dados, mas nada aprofundado).
Trocando em miúdos, fomos de uma série de recomendações que eram passíveis de serem endossadas para legislações rigorosas e que citam, inclusive, penalidades financeiras. Mesmo com variações grandes, as três leis se preocupam muito com a proteção da “ponta final”, do usuário que tem seus dados mal utilizados ou vazados.
Para a nossa coluna, vamos além da polêmica sobre os recentes atos do Facebook: dentre diversos ângulos possíveis para analisar, gostaria de mergulhar sobre como o uso comercial do e-mail é visto pelas três regulações.
A ideia é olharmos a maneira que as leis impactam a vida de quem faz PR e Assessoria de imprensa, cujos profissionais não raramente transmitem conteúdo em massa via e-mails – tema que as leis de proteção de dados passam agora a tratar, mesmo que indiretamente. Para começar, elaborei o seguinte quadro comparativo a fim de facilitar o entendimento.
Para a análise, vale dizer que, em nenhuma das três, temos o enquadramento direto do trabalho feito por agências de comunicação, ou seja, a divulgação de pautas e press releases. O máximo é a isenção de materiais jornalísticos na lei brasileira, mas aqui entramos na velha discussão até onde o assessor de imprensa é uma categoria do jornalismo; ou mesmo onde entra a função de RPs, publicitários e outros profissionais que não são jornalistas, mas atuam como assessores.
Independentemente disso, o importante é lançarmos um olhar sobre a questão da dispersão de conteúdo. Um press release que divulga uma nova coleção de roupas de um cliente está mais próximo da informação ou do e-mail marketing? A informação de opções de viagens ou hotéis, enviada para centenas de jornalistas que (em tese) se interessam por turismo está em qual categoria?
Uma resposta para essas reflexões está na mudança cultural dos assessores e PRs, para que estes pensem estratégia e tática de comunicação de maneira cada vez mais segmentada, encaixando o mailing certo no conteúdo certo. Se muitos dizem que se foi o tempo de grandes campanhas na televisão, mirando o horário nobre, o mesmo podemos dizer sobre o disparo desenfreado de e-mails em massa, sem a inteligência devida.
Isso é um uso escuso da tecnologia, tal qual fez o Facebook… tal qual fazem empresas que vendem contatos… tal qual fazem robôs de telemarketing sem nenhuma lógica… enfim, os exemplos são infindáveis… Voltando ao quadro, vemos que as três leis dão margem a interpretações e não podemos garantir que, no futuro, um jornalista (destinatário) reclame por receber demasiados press releases cujos conteúdos pendem mais para o marketing do que para a informação pública. É um risco que agências não podem (nem devem) correr.
Ao mesmo tempo, nem só de riscos vivem a indústria do RP perante a nova legislação. Temos aqui uma oportunidade para valorizar de vez as agências que investem em tecnologia e em serviços estruturados de banco de dados de jornalistas daquelas empresas que ficam à margem se aproveitando de mailings em Excel ilegalmente cedidos por colegas de profissão. Se informação é dinheiro, o banco de dados agora vale ouro – tanto para obter quanto para protegê-lo.
Comunicação bem feita usa a tecnologia ao encontro dos esforços para a boa imagem pública do cliente e reputação do assessor/agência, e não ao contrário! A própria definição da palavra já indica que tecnologia existe para facilitar/agilizar a vida humana. Façamos isso então, assessores e PRs. É o caminho certo para revalorizar as profissões e o campo da Comunicação.
Texto originalmente publicado no Observatório da Comunicação Institucional.